O Silêncio da Maldade

Como já dizia o filósofo Cícero, “Quanto melhor uma pessoa, mais difícil suspeitar da maldade alheia”. Essa reflexão parece ser a chave para compreender as atitudes ingênuas de alguns personagens em Não Fale o Mal (Speak No Evil), um filme que explora as complexidades do mal de maneira sutil e perturbadora.Dirigido por James Watkins, este remake de 2022 revisita a obra dinamarquesa original, mantendo o cerne da trama, mas trazendo algumas modificações que influenciam diretamente a percepção do público. A história gira em torno de dois casais que se conhecem durante as férias: os americanos Ben (Scoot McNairy), Louise (Mackenzie Davis) e sua filha Agnes (Alix West Lefler); e os britânicos Paddy (James McAvoy), Ciara (Aisling Franciosi) e seu filho Ant (Dan Hough). Eles compartilham momentos de descontração durante a viagem, mas a divergência entre suas personalidades torna-se logo evidente.Enquanto Ben e Louise estão à beira de um divórcio, Paddy e Ciara exibem a energia de um casal recém-formado. Essa disparidade entre os dois casais, somada ao comportamento oposto de seus filhos, torna ainda mais estranho o surgimento de uma nova amizade. No entanto, é esse elo improvável que os leva a aceitar um convite para passar o fim de semana na fazenda dos britânicos, onde o ambiente rapidamente se transforma de acolhedor para inquietante.A decisão de seguir para um local isolado com pessoas praticamente desconhecidas já soa imprudente, mas o filme faz um trabalho eficaz em criar uma atmosfera de tensão crescente, à medida que o público percebe que a família americana está completamente fora de contato com o mundo exterior. Essa ausência de comunicação acentua o isolamento e a sensação de impotência, tanto para os personagens quanto para o espectador.Ao contrário do original, o remake adota uma abordagem mais direta, oferecendo mais explicações sobre as ações e motivações dos personagens, tornando o enredo mais explícito. Para alguns, isso pode diminuir o impacto do mistério, mas é inegável que a tensão permanece presente, com a narrativa sendo conduzida de maneira claustrofóbica, aprisionando emocionalmente tanto os protagonistas quanto o público.As performances de Scoot McNairy e James McAvoy são notáveis, com McNairy trazendo à tona uma vulnerabilidade em Ben que desafia a ideia de que a bondade e a confiança podem ser, em excesso, armadilhas. McAvoy, por sua vez, entrega um Paddy perturbador, cuja natureza ameaçadora está enraizada em sua normalidade assustadora.Em tempos em que as fronteiras entre liberdade pessoal e responsabilidade coletiva se tornaram cada vez mais tênues, Não Fale o Mal serve como um lembrete perturbador de que estabelecer limites é crucial. O filme deixa claro que a confiança irrestrita pode, em última instância, se tornar um perigo. E às vezes, a sobrevivência depende de saber até onde é seguro avançar.

*Título assistido em Pré estreia promovida pela Universal Pictures.

Foto: Divulgação/Universal Pictures

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