Foto: Martin Bernetti/ AFP

No campo do documento que indica o gênero, no lugar de “F”, ou “M”, iniciais para feminino e masculino, Shane tem um “X”

Shane Cienfuegos de 29 anos, foi a primeira pessoa a receber uma carteira de identidade no Chile sem identificação de gênero, um ato que considera uma “vitória” contra a discriminação e contra a violência sofrida por sua comunidade.

“Senti um grande peso colocado nos meus ombros”, disse, em uma mistura de nervosismo e descrença dez dias após receber a primeira carteira de identidade não binária do país.

“É difícil ser a primeira pessoa”, reconheceu Cienfuegos em entrevista à agência de notícias France Presse.

Shane pede para se identificar com o uso do pronome “elu” (“elle”, no espanhol), não previsto pela norma culta, por se considerar “trans não-binário”.

Os “não-binários” não se sentem exclusivamente masculinos, ou femininos, mas se percebem como ambos, uma combinação dos dois.

“Essa não é uma vitória de Shane, é uma vitória coletiva” das pessoas não binárias, acrescenta Cienfuegos, com seu longo cabelo preto, barba, batom vermelho e um vestido florido com lenço no pescoço.

Isso deu a essas pessoas uma janela de oportunidades que antes não existiam em termos de legitimidade de sua identidade de gênero. Hoje, elas podem gerar processos de integração em espaços de educação e trabalho”, acrescenta, ao explicar a luta que, no seu caso, significou nove anos de processos judiciais.

Conseguir o “X” alivia, no entanto, apenas uma parte da extensa batalha para evitar a “discriminação” que as pessoas “não-binárias” sofrem, tanto “fora da comunidade quanto dentro”, diz Cienfuegos.

“Elu” já sofreu três tentativas de assassinato. Em uma delas, por meio de um empurrão na estação de metrô de Santiago.

“Não sei quantas vezes já tive que lutar pela minha vida nas ruas. Sobrevivi. Foi duro sobreviver a um sistema cruel e desumano, que só quer nos deixar nas ruas” conta Shane ao apresentar seu livro ”Através do CIStema: memórias e reflexões de uma travesti”, no Centro Cultural do bairro de Las Condes, onde alguns lhe pediam foto, enquanto outros olhavam impressionados.

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